Mosteiro escondido guarda milénio e meio de histórias

As paredes estavam verdes de musgos e de bolores e entravam raízes de figueiras, conta Sofia Pinheiro, uma jovem que serve de guia aos visitantes do mosteiro de Vilar de Frades, explicando as recentes intervenções. No monumento, ignorado por quem passa perto na estrada que liga Braga a Barcelos, “o número de visitantes é pequeno”, confessa.


Ao conduzir um casal do Porto que veio alertado pelas Jornadas Europeias do Património, a jovem guia lembra como boa parte do espólio se preservou “graças ao antigo sacristão, o senhor Manuel, que mesmo assim usava a sala do capítulo como adega”. No claustro ainda há colunas e capiteis desalinhados, a carecer estudo. As pedras do mosteiro — que sofreu sucessivas destruições e reconstruções —, tanto podem ser do século VI como do século XVIII.

Fundação atribuída a S. Martinho de Dume

Perto da margem esquerda do Cávado, o mosteiro de Vilar de Frades terá sido fundado pelo bispo S. Martinho de Dume em 566. Esta proposta de datação foi avançada por frei Leão de Tomás, tendo por fonte uma carta de um monge beneditino, escrita em 571.


A total ruína, por causa das invasões muçulmanas, levou à reconstrução por encomenda de D. Godinho Viegas, nobre do Entre Douro e Minho envolvido na Reconquista, por volta de 1070, conferindo-lhe feição românica. Deste período resta o portal, de três arquivoltas ornamentadas de elementos naturalistas e geométricos, assentes em colunelos com capitéis historiados com um bestiário típico do românico; existem ainda vestígios de uma janela e os arranques da torre sul, incompleta, onde hoje se integra o portal.

Congregação dos Lóios ocupou mosteiro no século XV

No início do século XIV a propriedade despovoou-se, e em 1425, foi entregue aos cónegos Lóios, uma congregação dirigida por João Vicente, futuro bispo de Lamego e Viseu. Este prelado conseguiu para a congregação considerável autonomia em relação à diocese de Braga. Mas também conseguiu tensões com o arcebispo D. Fernando da Guerra, que optou por anexar igrejas ao mosteiro procurando afirmar a sua autoridade.


D. Diogo de Sousa ampliou e actualizou decoração

A partir do século XVI, com D. Diogo de Sousa na Sé de Braga, obras de ampliação e remodelação alteraram o medievo mosteiro românico. Datam de meados de quinhentos dormitórios, refeitório, cozinha, biblioteca e o claustro, e uma torre, a norte. Do manuelino conserva-se o portal principal em arco conupial, entre dois colunelos a sugerir troncos podados. Do mesmo período é datada a abóbada nervurada cobrindo a nave única da igreja-salão, com capela-mor concluída apenas em meados do século XVII.


A autoria de parte das obras quinhentistas foi recentemente atribuída a um famoso arquitecto dividido entre a Galiza e o Norte de Portugal — João Lopes o Velho, que tem obra também em Viana do Castelo. A nossa guia diz-nos que o plano geral poderá ter passado pela mão de João Castilho, responsável pelos Jerónimos.

Órgão da igreja: máquina irremediavelmente destruída

Quinhentistas são ainda o cadeiral do coro, o órgão da igreja, cuja máquina foi irremediavelmente perdida, e o retábulo do altar-mor, sendo já de final do século o retábulo do Espírito Santo.
O templo sofreu posterior intervenção seiscentista, com a conclusão da capela-mor e a reconstrução do corpo da igreja, então em mau estado.


No século XVIII a fachada principal foi remodelada, sendo desse período sinais evidentes do neogótico e integrando-se o portal do século XI na torre sul, que se encontra incompleta e sobre a qual, conta-nos Sofia Pinheiro, correm muitas lendas.
Aos períodos de pujança económica correspondem encomendas artísticas de maior vulto.

Entre outros elementos de principal interesse no interior, sobressaem painéis em azulejo, com datações que evoluem desde os seiscentistas, assinados, forrando capelas do interior, e outros ainda do século XVIII. Do mesmo período é a imponente peça de talha em estilo nacional, datada de 1697.

Sobre as capelas laterais funcionam salas de catequese e do agrupamento de escuteiros.
Um chafariz antes localizado no pátio do convento, e classificado como monumento nacional, foi transferido para Barcelos em 1967, permanecendo desde então no Largo da Porta Nova.

26-09-11 - Correio do Minho

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